Aqui é Meu Lar conta a história de Alessandro e Paulo José De Cezaro que produzem vinhos finos orgânicos

A Miriam Caravaggio 95.7 FM, veicula neste sábado dia 07 de outubro de 2023, o segundo programa “Aqui é Meu Lar”, com o tema “Pés no interior, olhos na cidade. Volta às origens” O tema aborda pessoas que vivem no interior e estudam na cidade, ou, que por muito tempo tiveram uma vida urbana e decidiram ir para o interior produzir, nascidos ou não no interior. Os destaques da entrevista, Alessandro Mateus De Cezaro, 28 anos e Paulo De Cezaro, 61, moradores da Linha Caçador (3º Distrito de Farroupilha). Junto com seu pai, Alessandro é proprietário da Vinícola De Cezaro e trabalha na plantação da uva ao envaze. Desde 2001 a empresa atua com certificação orgânica.

Alessandro conta que no passado sonhava em estudar Agronomia, para trabalhar nos parreirais e utilizar os conhecimentos teóricos na agricultura. No entanto, por conta da iniciativa do pai em empreender em uma Vinícola, acabou cursando administração na Universidade de Caxias do Sul, de 2012 a 2022. Com o pai, atua na Vinícola na produção de vinhos, espumantes e sucos orgânicos. Seu desejo é seguir o projeto e assim concretizar o desejo do pai de fazer a sucessão.

Paulo José De Cezaro é o responsável pela criação da Vinícola, registrada em 2001, mas antes já produzia vinhos no porão da casa do seu pai. Hoje, Paulo toca a empresa com seu filho, depois que se separou de sua esposa. Desde menino trabalhava com o pai na produção de uva. Porém, em determinado momento devido às dificuldades para comercializar a uva, seu pai aproveitou os conhecimentos na produção de vinhos para o consume e decidiu produzir também para o comércio. Foi então quando iniciou a Vinícola De Cezaro, ainda no porão e em pequena quantidade.

Em uma área próxima a oito hectares a produção de uva ocupa cerca de dois hectares de plantio de parreira das espécimes Tannat, Merlot, Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Moscato, Sauvignon Blanc, Riesling, Peverella e Moscato Embrapa. Dos parreirais próprios, o volume chega a 15 mil quilos anualmente. A produção de vinhos, espumantes e sucos é completada com aquisição de uvas junto à Associação Farroupilhense de Agroecologia (Afaga), com a Bordô, Niágara e Isabel, e de outros produtores orgânicos de Nova Roma do Sul e Flores da Cunha.

Motivação para o Orgânico

Paulo conta que a decisão de produzir orgânicos foi motivada quando seu pai ainda era vivo. Começou sentir dores frequentes de cabeça, causadas pelo veneno utilizado no tratamento das parreiras. Ele lembra que perguntou ao pai, como era feito o tratamento até a chegada dos “Cidas da Vida”?. Seu pai respondeu que era feito com sulfato, cal e enxofre. A partir daí, decidiram voltar a produzir como era antigamente. Com o falecimento do pai, continuou com a produção orgânica. Em 2001, De Cezaro participou de um curso de capacitação rural do Sindicato dos Trabalhadores Agricultores Familiares de Farroupilha, em que um dos módulos era sobre a agroecologia.

A partir desse momento, muda a história da Vinícola De Cezaro, que passa a produção orgânica, tendo acompanhamento técnico. Paulo conta que para fazer a transição não foi difícil, a propriedade já vinha deixado de utilizar os fungicidas, utilizando apenas herbicidas e adubação nitrogenada. A opção foi por variedades Bordô e abrir mão da Isabel e Niágara, pela facilidade da produção de Bordô no sistema orgânico. Diante disso, houve a necessidade de fabricar vinhos finos orgânicos, momento em que os parreirais de Bordô foram erradicados e construídos parreirais viníferos, porém em cultivo protegido, o que limitou em cerca de um hectare e meio. No momento e ideia é chegar mais de dois hectares de área cultivada.

Paulo lembra que o custo de produção nesse modelo protegido é alto, por isso a escolha foi de variedades de vinhos finos que brotam tarde, porque na região, a geada é tardia. “Então nós temos alguns limites, por exemplo, os vinhos mais famosos, Pinot Noir, Chardonnay, Moscato Giallo é difícil a produção, porque brotam cedo. Então optamos por Cabernet Sauvignon, Melot e o Tannat, que  brota mais tarde, mas um pouquinho mais cedo do que o Cabernet Sauvignon, Blanc e o Moscato antigo. Uma tentativa de resgatar uma variedade Vernaccia ainda não deu resultado esperado”, relata.

Hoje a propriedade produz uvas finas em cultivo protegido. Paulo lembra que é um grande desafio, porque a uva não é igual a que está em um ambiente natural. “O grande desafio é encontrar um equilíbrio para produzir um grande vinho fino. A gente tem vinhos bons, mas ainda estamos correndo atrás para produzir um grande vinho. O nosso diferencial hoje é a produção de vinhos orgânicos e com práticas biodinâmicas também. Não temos o certificado da biodinâmica, mas usamos algumas práticas da biodinâmica”, confessa. Esse processo utiliza o calendário como orientação para as ações como poda, roçados e aplicação de alguns preparados biodinâmicos. Paulo não vê no momento essa necessidade de certificação biodinâmica, mas garante que com mais alguns ajustes poderá conquistar esse selo.

Alessandro disse que vê com muita propriedade os benefícios que o orgânico traz tanto para o consumidor como para quem produz, pelo equilíbrio da natureza com a utilização de métodos biológicos e biodinâmicos. Ele conta que a região Sul ainda tem alguma resistência ao uso de produtos orgânicos, mas nas grandes capitais do Brasil, já há um comércio interessante para a agroecologia. A produção da Vinícola De Cezaro, abastece lojas especializadas de orgânicos e produtos naturais. A empresa é operacionalizada por Alessandro, junto com seu pai, o tio Daniel e a tia Silvia (esposa do Daniel). Alessandro e Paulo cuidam da produção da uva e do envaze, com a ajuda de Silvia, enquanto o Daniel responde pela área comercial.

A Cantina também participa de concursos, há dois anos foi a primeira colocada no Concurso de suco de uva integral natural, na Expointer. Esse ano conquistou o segundo lugar no 11º Concurso da Agroindústria de Produtos da Agricultura Familiar, na categoria de sucos de uva integral e natural. Paulo disse que essas condecorações são motivos de alegria para a empresa, porque é um dos sonhos realizados e o reconhecimento de outras pessoas, do consumidor e do comércio. “Para nós é um incentivo a mais e um compromisso a mais. Se nós atingirmos um patamar de qualidade, precisamos manter e melhorar também, sempre é um desafio, se fala do mercado, o mercado é um grande desafio”, desafia.

Paulo lembra que com a pandemia e outras situações do mercado, reduziu o poder aquisitivo da população, e a primeira medida é corte do consumo de bebidas, por isso, se houve um impacto muito grande. Ele pontua que com a abertura do mercado brasileiro para o Mercosul, hoje os produtores sofrem uma concorrência desleal com uma empresa do Chile, que consegue colocar vinhos com preços competitivos, no mercado brasileiro, porque naquele país existem subsídios, ao contrário do Brasil. O contrabando vindo da Argentina e Uruguai, é outro Calcanhar de Aquiles, principalmente das pequenas Vinícolas.

“As grandes Vinícolas conseguem reduzindo custos se manter, agora as pequenas quando você tem já uma margem pequena e ainda sofre concorrência desleal, o impacto é grande. Então muitas vezes ter uma empresa nessas condições é um ato de heroico. Mas estamos ai, quem sabe os nossos governantes nos ajudem, quem sabe subsidiar a agricultura, principalmente a orgânica?. Quero dizer que a saúde não é só de quem trabalha, ou só do consumidor, quero dizer que com a agricultura orgânica todos ganham, a natureza ganha, ganha o produtor que não lida com produtos químicos e o consumidor que no final vai ter um alimento saudável. Os governos poderiam olhar com outros olhos para o orgânico, porque é a agricultura do futuro, se nós não preservarmos o nosso planeta, vamos morrer abraçados e com essa mudança climática o planeta deverá pegar fogo, então, uma agricultura orgânica é um dos caminhos para ajudar a salvar o planeta”, acredita.

A Vinícola integra a Afagro, que tem 26 agricultores associados e três Agroindústrias. A entidade realiza feira ecológica na Estação Férrea em Farroupilha, todas as quartas-feiras, a partir das 16 horas. Ele disse que existe uma mobilização para incentivar o consumo de produtos orgânicos, porque essa é uma caminhada que deve acontecer entre consumidor e produtor, pois entende que um depende do outro. A Afagro tem ainda uma banca na José Bonifácio em Porto Alegre, onde atende um público específico na capital.

Paulo José De Cezaro, nasceu na propriedade onde reside, mas seu pai é natural da comunidade de São João, que na época pertencia ao município de Montenegro. A família De Cezaro chega na região, por volta de 1875, na Linha Palmeiro, comunidade de São Marcos, com a vinda do tataravô, que chegou com o bisavô de Paulo, Viccenzo e os seus dois tios, Bortolo e Giacomina. Seu avô morou em São João e mais tarde se instalou na Linha Caçador.

Alessandro pretende seguir na agricultura e dar continuidade ao empreendimento do pai. Ele integra atualmente a direção do Sindicato dos Trabalhadores Agricultores Familiares de Farroupilha (Sintrafar). Para o futuro, visa aumentar a capacidade da empresa, sempre em busca de melhor rentabilidade. Recomenda para aqueles que tem  interesse em trabalhar na agricultura, o método orgânico, por entender que é um mercado promissor. Segundo ele, o jovem que está na fase de decidir seu futuro, o interior é um caminho, que além da qualidade de vida, o interior se modernizou e facilita o acesso à internet, energia elétrica de qualidade, mobilidade e bons serviços de saúde. Paulo José recomenda a agricultura para quem estiver pensando o que fazer no futuro, acredita que sem o agricultor não há ser humano vivo e  considera duas profissões fundamentais: agricultor e professor. “Se não plantar a cidade não come e sem professor não tem profissão. “Todo mundo olha para o médico, como a melhor profissão do mundo, mas sem o professor não existiria médico”, observa. Ele lamenta que nenhuma dessas profissões (agricultor e professor), recebem a valorização que merecem.

Galeria – fotos: Rafaela Vargas